sábado, agosto 30, 2008

Monsenhor Klaus Gamber e a questão da reforma litúrgica


Terminei a leitura de "La Réforme Liturgique en question", de Monsenhor Klaus Gamber. É um excelente livro, escrito de modo sucinto (cem páginas) mas muito rigoroso, que recomendo sem hesitar a todos que pretendam tomar um primeiro contacto com este tema, mas não disponham de tempo ou vontade para se abalançarem às seiscentas páginas do fundamental "Pope Paul's New Mass", de Michael Davies.

Monsenhor Klaus Gamber nasceu em 1919, na cidade de Ludwigshafen, Alemanha, e foi ordenado sacerdote em 1948. A partir de 1957, altura em que fundou o Instituto Litúrgico de Ratisbona, dedicou-se inteiramente ao estudo das liturgias ocidentais e orientais, actividade onde alcançou merecido reconhecimento e prestígio. Faleceu com setenta anos de idade, quando ainda havia muito a esperar da sua pessoa.

No livro ora em análise, enuncia e desenvolve as grandes teses críticas da reforma litúrgica de 1969, de autoria do Papa Paulo VI, as quais se tornaram clássicas no actual movimento católico tradicional, e que se podem subsumir nas seguintes alíneas:

a) A reforma litúrgica criou um novo rito - o rito moderno ou de Paulo VI - em contraposição ao rito romano tradicional quinze vezes secular;

b) Ultrapassou amplamente as intenções reformistas dos padres conciliares plasmadas na "Constituição sobre a Sagrada Liturgia", as quais já haviam sido plenamente alcançadas e garantidas com a promulgação do Missal de 1965;

c) Obedeceu na sua concepção e execução aos erros teológicos e histórico-litúrgicos que os seus mentores sobraçavam, por influxo directo da nova teologia modernista e progressista;

d) Enfatizou a dimensão protestante da Missa como mera refeição memorial, em detrimento da sua natureza sacrificial especificamente católica;

e) Não aumentou os sentimentos de reverência e piedade litúrgica dos fiéis, e ao invés contribuiu determinantemente para a abrupta queda da prática religioso pós-conciliar.

A defesa que Monsenhor Klaus Gamber encetou do rito tradicional face ao rito de Paulo VI, acarretou-lhe a ostracização pela generalidade do episcopado alemão, um dos mais influenciados pela heresia modernista na Europa. Isso não impediu que fosse muito considerado e respeitado por cardeais como Alfons Stickler, Sílvio Oddi e… Joseph Ratzinger.

Do prefácio que este último, agora reinando gloriosamente sob o nome de Bento XVI, escreveu para edição francesa do livro (a que aqui analiso), respigo o seguinte:

"Ce qui s'est passé après le Concile signifie tout autre chose: à la place de la liturgie fruit d'un développement continu, on a mis une liturgie fabriquée. On est sorti du processus vivant de croissance et de devenir pour entrer dans la fabrication. On n'a plus voulu continuer le devenir et la maturation organiques du vivant à travers les siècles, et on les a remplacés - à la manière de la production technique - par une fabrication, produit banal de l'instant. Gamber avec la vigilance d'un authentique voyant et avec l'intrépidité d'un vrai témoin, s'est opposé à cette falsification et nous a enseigné inlassablement la vivante plénitude d'une liturgie véritable, grâce à sa connaissance incroyablement riche de sources. (...) son oeuvre pourrait nos aider à prendre un nouvel élan."

De resto, deste livro resulta muito interessante constatar o modo como o pensamento de Klaus Gamber influenciou de forma decisiva o actual Papa em matéria litúrgica, sendo curiosíssimo verificar como o primeiro há cerca de trinta anos, em artigo originalmente publicado na revista "Una Voce Korrespondenz" e correspondente ao capítulo "Tentative de Solution" da obra em consideração, delineou algo de muito semelhante ao consagrado no "Summorum Pontificum". Eis aqui mais um estímulo para ler "La Reforme Liturgique en question".

E termino citando o voto com que Gamber remata o seu livro:

"Nous ne pouvons que prier et espérer que l'Église romaine reviendra à la tradition et autorisera à nouveau partout la liturgie de la messe vieille de bien plus de mille ans. Pourquoi deux formes, l'ancien et le nouveau rites, ne pourraient-elles pas subsister paisiblement côte á côte? Comme en Orient où il y a plusieurs rites ou liturgies; ou même en Occident, aujourd'hui encore, où il y a des rites particuliers comme à Milan. Sans parler du fait qu'actuellement presque chaque curé modèle la messe à sa guise.

Mais de tout façon il faudrait que le nouveau rite soit amelioré par rapport à celui qui se pratique de nos jours.

En cette époque d'affaiblissement de la foi où nous vivons aujourd'hui, l'appel à sauver ce qui peut l'être encore se fait de plus en plus pressant. Aussi paradoxal que cela puisse paraître, ce ne sont pas les prétendus adeptes du progrés, eux qui abandonnent de plus en plus ce qui s'était harmonieusement développé dans l'Église pour le remplacer pour des expériences douteuses, qui sont vraiment "modernes" de nos jours, mais ce sont les conservateurs qui connaissent la valeur de ce qui nous a été transmis. A condition qu'ils restent ouverts aux exigences pastorales de notre temps.

Dans le cas présent, cela signifie ceci: il faut qu'à l'avenir le rite plus que millénaire de la messe soit conservé dans l'Église catholique romaine, pas seulement pour les prêtres et laïcs âgés, incapables de s'adapter, mais comme forme primaire de la célébration de la messe. Il faut qu'il redevienne la norme de la foi et le signe de l'unité des catholiques dans le monde entier, un pôle fixe pour un temps déboussolé et en perpétuel changement"
(destaques meus).

0 comentários: