segunda-feira, agosto 29, 2011

Leituras de Agosto - "Europe and the Faith", de Hilaire Belloc


A tese desenvolvida por Belloc neste livro é simples e conhecida, apesar de esquecida nos dias que correm. Convém, pois, recordá-la: na sua essência, a Europa é o resultado directo da cultura greco-romana clássica matizada pelo baptismo cristão que lhe foi ministrado pela Igreja Católica.

Sustenta Belloc que nunca ocorreu uma queda, uma desaparição no sentido literal da palavra, do Império Romano; este último, ao invés, a partir do século V, com o enfraquecimento dos laços centralizadores que uniam administrativamente as diferentes províncias imperiais a Roma, transmutou-se num conjunto de unidades politicamente independentes entre si, porém espiritualmente ligadas a Roma, já não pelo poder militar das legiões, mas pelo elo religioso nelas infundido pela Igreja Católica. E sob o influxo desta última, a Europa conseguirá superar o período obscuro e turbulento que se seguiu à desaparição do poder imperial romano e, a partir do século XI, guindar-se-á a uma nova época de dois séculos, que conhecerá o seu zénite coma Cristandade do século XIII - a Cristandade onde viveu São Tomás de Aquino -, em que mais do que nunca fará sentido o lema tão caro a Belloc: “a Europa é a Fé, e a Fé é a Europa!”

Com o dealbar do século XIV, e por causa daqueles que voluntária ou involuntariamente colaboram com as forças que imprimem um sentido anticristão à História, iniciar-se-á a erosão da Cristandade medieval, que culminará com a brutal ruptura da unidade espiritual europeia provocada pela reforma protestante do século XVI, o primeiro de muitos abalos que a Europa sofrerá na sua essência. Daqui se abrirão as portas sucessivamente à idolatria do poder absoluto do Estado, ao iluminismo jacobino, à revolução francesa, ao liberalismo laico e ao capitalismo desregrado, ao socialismo ateu, à revolução russa e à guerra mundial (este livro foi originalmente lançado em 1920), autênticas antecâmaras da erecção na Europa do Estado Servil ou Tecnocrático animado por uma ideologia anticristã, jacobina e internacionalista, antítese última das ideias de Cristandade e Europa, pois, como Belloc sempre insiste, “a Europa é a Fé, e a Fé a Europa!"

Leitura recomendada, já que - como li algures - conhecer a História é ser-se católico.

P.S. Para além da edição em língua inglesa deste livro, da responsabilidade da “TAN”, existe também uma espanhola, “Europa y la Fe”, publicada pela “El Buey Mudo”.

P.P.S. Este artigo é publicado em simultâneo no blogue “A Cigarrilha de Chesterton”.

Michael Voris em Fátima

quinta-feira, agosto 18, 2011

Leituras de Agosto - "Maximilien Kolbe - Prêtre, journaliste et martyr (1894 - 1941)", de Philippe Maxence


É bem conhecido da generalidade dos católicos contemporâneos, o episódio da morte heróica de São Maximiliano Kolbe no campo de concentração de Auschwitz. Menos conhecido, ainda que não de menor importância, é o seu exemplar percurso de vida de religioso franciscano. O livro de autoria de Philippe Maxence, recentemente publicado, vem agora suprir esta última lacuna.

Através de tal trabalho, o leitor trava conhecimento com um homem incomum, sacerdote católico fora do vulgar (ainda que de temperamento e trato nem sempre fáceis) e valorosíssimo cavaleiro da Imaculada Conceição, que sob os auspícios de Nossa Senhora e através de um apostolado exercido eminentemente por meio da imprensa, se entregou por inteiro à instauração da ordem social cristã, à conversão de pecadores, hereges, cismáticos, judeus e não crentes, e ao combate contra as heresias da modernidade, que ele entendia personificadas na actuação da Maçonaria no mundo. Em pouco mais de vinte anos de sacerdócio, e até ao seu derradeiro sacrifício consumado em Auschwitz, este doutorado em Filosofia e Teologia pela Universidade Gregoriana de Roma, antigo aluno do grande Cardeal Louis Billot, movido por uma força de vontade sobre-humana, levaria o seu infatigável labor missionário e o seu incansável combate pela conversão das almas da Polónia ao Japão, passando por sítios tão diferentes quanto a Itália, a Índia ou a China.

Com a leitura deste livro, toma-se consciência do carácter excepcional de São Maximiliano Kolbe, sem dúvida modelo de acção a ser considerado em pleno por todos os católicos defensores da tradição (não por acaso, os Franciscanos da Imaculada reclamam a continuidade da sua obra), o que torna legítimo questionar como teria o mesmo reagido perante todas as novidades trazidas à Igreja pelo Concílio Vaticano II? Ora, sabendo-se quais os grandes objectivos que direccionaram toda a sua vida, parece fácil de adivinhar qual teria sido essa reacção… Porém, aqui os planos da Providência foram outros.

São Maximiliano Kolbe, rogai por nós!

quinta-feira, agosto 11, 2011

Leituras de Agosto - "Juana Tabor" e "666", de Hugo Wast


Num tempo normal, que não o que vivemos, o argentino Hugo Wast seria aclamado como um dos maiores escritores do século XX. Ao contrário, a nossa estranha época remeteu-o para um esquecimento mais do que comprometido: sabendo-se os antivalores que a dominam, compreende-se o porquê de tal atitude.

Em “Juana Tabor” e “666”, que a madrilena “Homo Legens” reeditou há não muito num único e cuidadíssimo volume, Wast demonstra em pleno todo o seu brilhantismo e genialidade. Nestas duas obras originalmente publicadas em 1942, de que “666” é a continuação e desenlace de “Juana Tabor”, e cuja acção decorre numa época pré-apocalíptica, situada pelo escritor nos últimos anos do século XX, durante a qual o Anticristo prepara a sua ascensão ao poder absoluto, o leitor acompanha eminentemente o percurso espiritual de dois membros de uma mesma ordem religiosa (a imaginária Ordem Gregoriana): o do velho Frei Plácido de Santiago e o do seu jovem superior Frei Simón de Samaria. Enquanto o primeiro mantém em tempos difíceis uma plena fidelidade à doutrina tradicional católica, o segundo arrogando-se o papel de reformador e modernizador da Igreja, ao pretender adaptá-la às supostas necessidades do mundo contemporâneo, acaba por enveredar por caminhos que o levarão à apostasia total e a transformar-se num mero peão do Anticristo.

Quase setenta anos decorridos desde a primeira edição destas obras, e sabendo-se o verdadeiro percurso que a Igreja Católica sofreu de 1942 até à actualidade, causa admiração a forma exacta e precisa como Hugo Wast retratou Frei Simón de Samaria - defensor de muitas, estranhas e heréticas teses -, este surge retrospectivamente aos olhos do leitor actual como um misto de Teilhard de Chardin e Karl Rahner. Só por isto, vale a pena ler tais livros. E Wast é um escritor cativante, cuja leitura, uma vez iniciada, é muito difícil de ser interrompida.

Pela comunhão sempre de joelhos e na boca