Ruídos de vozes chegavam.
- Aqui para nós, padre Anselmo, ouvia-se contestar padre
Fernando, a frequência excessiva do coro não tem nenhuma utilidade prática.
- Rezar é bom, mas trabalhar é melhor, corroborava o
beneficiado Trigueiros.
- Não me surpreende a objecção, ripostou padre Anselmo. É o
reparo de muito bom cristão. Não se compreende, não se quer compreender o que é
de fácil compreensão. Mas em ministros da Igreja é de pasmar. Pois se há função
que o sacerdote execute de mais proveito social é precisamente a oração
litúrgica, o ofício divino. Sim, meus amigos.
No claustro, o monge toma sobre si o melindroso encargo do
dever social da oração que as solicitações do século e as ocupações profissionais
impedem tanto padre de cumprir. Um capítulo de monges, permitam-me o grosseiro
da comparação, é como certas fossas modernas, recebe as fezes dos pecados e
transforma-os em linfa clara:
A função dos mosteiros é depurar, é decantar, clarificar as
impurezas das almas. São sumidoiros do mal. Têm sofrimentos indebeláveis?
Endossem-nos às piedosas orações dum claustro que lá lhos desgastam
pacientemente. Duvidam? Desgraçada gente de pouca fé!
Manuel Ribeiro, in “A Catedral”, Lisboa, Livraria
Renanscença, Edição Especial Ilustrada, 1925, páginas 240 e 241.