domingo, outubro 02, 2005

O Catolicismo na História de Portugal

O texto de Vázquez de Mella de que o Rafael abaixo dá conta, trouxe-me à memória, este outro de António Sardinha, que passo a transcrever, retirado do seu estudo "As Quatro Onças de Oiro", publicado no livro "Da hera nas Colunas". É impressionante a similitude do pensamento dos dois grandes tradicionalistas peninsulares:

"Assevere-se o que se asseverar, sustente-se o que se sustentar, Portugal, surgindo para a luz do dia e em plena florescência mediévica, é filho legítimo do Cristianismo e a sua história mais não é do que um capítulo da história da Igreja. Distante ainda o alvor da nacionalidade, o que é que a prepara, a unifica e a disciplina senão o apostolado de S. Martinho de Dume no antigo reino dos suevos, fazendo, pela evangelização, da diocese bracarense o núcleo moral de que resultaremos mais tarde como nação organizada?

(…)

Já antes, o Cristianismo transformara as agrupações agrícolas da romanização na "paróquia" ou "freguesia", - espécie de comuna sem carta (…). Então o campanário que se levanta por cima das pobres habitações rústicas, deu-lhes a adesão necessária para as vilas se converterem em pequenas comunas, sem protecção em geral, e sem organização escrita, mas contendo a união de vontades, homogeneidade de sentimentos e comunidade de aspirações morais, que são a base da vida social. Cimento indestrutível que prendeu a raça à terra e lhe conservou a inviolabilidade do génio, a fé a manterá ligada e íntegra, mesmo quando o domínio muçulmano, firmando-se na linha entre o Mondego e Tejo, partir ao meio a faixa ocidental da Península. Porque sem o sopro faúlhante duma religião comum, tão ciosamente acalentada pelas populações moçárabes do sul, não se percebe como, à maneira que avançam os "fossados" e algarados da Reconquista, o território e as gentes que se iam ganhando em nada destoassem, pela linguagem, pelas crenças e pelos costumes, do povo de lavradores e cavaleiros a quem Deus incumbira da fundação de um novo reino.

(…)

Sem avançarmos pelo período afonsino adiante, de quanto se sumariou e expôs, depreende-se como, sem receio de séria contestação, a história de Portugal é, na sua essência, um capítulo da história da Igreja. Terminada a Reconquista, virá depois a epopeia da Fé e do Império, - virão depois as navegações e os descobrimentos. Mais se evidencia e afirma o carácter apostólico da nossa história. Subtraiam-na à inspiração e à direcção do Cristianismo, e o que resta a Portugal não é mais do que a história da sua decadência. Avivar, portanto, sem intenções apologéticas, mas unicamente pela restituição dos acontecimentos ao seu justo significado, os liames que prendem Portugal à Igreja e, como tal, ao úbere incontestável da verdadeira civilização, é praticar conjuntamente um acto de patriotismo e um acto de inteligência.

JSarto

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