Uma das características mais peculiares dos democratas é a de, sempre que podem e a ocasião se propicia, serem os primeiros a desrespeitar as regras mais basilares do funcionamento do sistema de que se dizem adeptos, desrespeito esse que aumenta numa grandeza directa e proporcional em relação às estridentes e exibicionistas afirmações públicas de fé democrática de que aqueles tanto costumam ufanar-se.
Vem isto a propósito da actual crise política que se vive em Portugal: pela minha parte, manifestando uma tremenda falta de simpatia por todos os seus protagonistas partidocráticos - a diferença entre uns e outros consiste no facto de os menos à esquerda pretenderem a destruição de Portugal a uma velocidade higiénica de 50 km/h, enquanto os mais à esquerda preferirem uma celeridade alucinada de 200 km/h -, a verdade é que o sistema tem as suas regras constitucionalmente definidas, as quais são sempre preferíveis à melhor das anarquias.
Assim, de acordo com as mesmas, através das eleições legislativas visa-se proceder à escolha dos deputados que durante o período de quatro anos que formam uma legislatura irão representar o povo português no Parlamento; não à nomeação de um qualquer candidato a primeiro-ministro, peculiar figura de todo desconhecida do nosso ordenamento jurídico. Ora, é ao Parlamento desta forma escolhido que incumbe aprovar o programa do governo que vier a ser constituído pela personalidade que o Presidente da República tiver convidado para o desempenho do cargo de Primeiro-Ministro, e isto tantas vezes quantas seja necessário durante a vigência da sua legislatura de quatro anos, enquanto o mesmo for capaz de gerar soluções políticas viáveis. Apenas se tal não suceder é que o Parlamento deve ser dissolvido antes de concluído o seu mandato quadrienal e só nessa circunstância convocadas eleições legislativas antecipadas; entender o contrário, isso sim, é patrocinar um verdadeiro golpe de Estado, ainda que sob a capa de uma pouco diáfana legalidade constitucional, com o único fito de acelerar e promover determinadas agendas políticas bem concretas.
Porém, acrescento que a solução final desta crise há-de ser encontrada longe do povo dito soberano, nos costumeiros conciliábulos mais ou menos discretos. Vamos pois aguardar, para ver se neste braço de ferro o mundialismo liberal pró-americano à Buiça se sobrepõe ao jacobinismo mais clássico de matriz afrancesada ou se sucede o contrário, ou seja, qual dos dois melhor influencia o Presidente da República.
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