domingo, julho 20, 2008

Indispensáveis bispos ...

«Já faz ao redor de cinqüenta anos que a quase totalidade dos países católicos renunciaram a sê-lo. Todos feridos do mesmo mal –do ateísmo e do laicismo– e perturbados pela desordem social e econômica que nenhum remédio parece conseguir curar. A isso se acrescenta uma terrível decadência moral que vai sendo imposta pelos adversários da Igreja, com mais ou menos êxito conforme o grau de resistência que encontram. Em certas ocasiões, alguns projetos como o aborto, o controle de natalidade, a legalização da homossexualidade e a educação sexual nas escolas não entram em vigor imediatamente pela coragem de certos bispos e políticos; mas, curiosamente, tais projetos nunca são deixados de lado. Os inimigos da Igreja e da Cristandade jogam com o tempo. Sabem que as suas idéias serão impostas mais cedo ou mais tarde, atrasando-as eficazmente e difundindo-as pelos meios de comunicação que eles controlam de modo quase exclusivo.
Durante esses cinqüenta últimos anos fizeram-se, em alguns países, tentativas de salvar a sociedade católica; no entanto, elas não tiveram efeitos duráveis. Existe algo assim como uma maldição que parece esterilizar todos os movimentos de restauração católica, ao mesmo tempo em que os adversários navegam sempre com bons ventos. A que se deve isso?
Numerosos são os leigos católicos que abandonam o combate, vencidos por repetidos fracassos. Enfim, alguns crêem que já não há nada a fazer senão esperar que venham “os acontecimentos” iminentes anunciados por aparições mais ou menos duvidosas. No entanto, nada vem… Pelo contrário, a decadência religiosa, econômica e social continua acelerando-se. Até onde chegarão os inimigos da Igreja? Como conseguem coroar com tanto sucesso seus funestos projetos?
A mesma Igreja está marcada por este sintoma de autodestruição. Por quê? A crise que Ela atravessa tem um lado misterioso, como o teve a Paixão de N. Senhor Jesus Cristo. Pois bem, podem-se apontar com certeza as autoridades culpáveis da morte de Cristo: os chefes dos sacerdotes judeus. Apertaram as mãos das autoridades políticas para condenar o Salvador e eliminar a influencia extraordinária que Ele exercia sobre a multidão, da qual estavam invejosos. São estas autoridades religiosas judias as que levaram Cristo diante dos tribunais civis e conseguiram sua condenação e morte.
Hoje vemos este mesmo concubinato das autoridades religiosas com os dirigentes políticos condenar à morte a sociedade católica. Os papas e os bispos nomeados por eles, impregnados de modernismo e liberalismo desde João XXIII, são os principais responsáveis de uma desintegração da sociedade católica que parece inevitável. Durante o último concílio pensaram ser possível fazer católicos os princípios da Revolução Francesa, tal como o afirmará o próprio Cardeal Ratzinger. É como querer batizar o diabo … Esta união contra natura da Igreja e da Revolução é a causa dos males que abrumam a Igreja e a sociedade civil. Estes princípios preparados nas lojas maçônicas são os que fizeram entrar “a fumaça de satanás” na Igreja e mataram a alma das sociedades católicas.
Não faz muito tempo um bispo que me recebeu no seu escritório confessou que tivera problemas para aplicar algumas reformas e aceitar alguns textos do último concílio. No entanto me disse: “seguindo o Papa, estava seguro de estar na verdade. Por tanto, aceitei tudo”. Com princípios semelhantes, São Paulo não deveria ter resistido a São Pedro e, nesse caso, todos os batizados ainda estaríamos submetidos à circuncisão e às praticas da religião judaica! Santo Atanásio também não deveria ter combatido a heresia ariana, nem deveria ter sido canonizado, apesar da oposição ao Papa. Ao escutar estas objeções, o bispo respirou fundo e conduziu a conversa a outros assuntos…
A Igreja e a sociedade padecem da caída dos bispos que já não têm coragem de ensinar a sã doutrina nem de denunciar o erro. Para muitos, o restabelecimento do reinado social de N. Senhor é um ideal envelhecido ou inalcançável. Por isso louvam o pluralismo religioso na sociedade e o exigem, recusando todo estatuto especial para a Igreja.
Queria comparar os dois textos que seguem, pois sua comparação vale mais do que uma longa explicação. O primeiro é de São Pio X e diz assim:

“Apoiar-se no princípio fundamental de que o Estado não deve cuidar de modo algum da Religião, implica numa grande injúria a Deus (…) Em segundo lugar, a tese de que falamos constitui uma verdadeira negação da ordem sobrenatural (…) Em terceiro lugar, esta tese nega a ordem da vida humana sabiamente estabelecida por Deus, ordem que exige uma verdadeira concórdia entre as duas sociedades, a religiosa e a civil (…). Finalmente, esta tese infringe um dano gravíssimo ao próprio Estado, porque este não pode prosperar nem conseguir estabilidade prolongada se despreza a Religião, que é a regra e mestra suprema do homem para conservar religiosamente os direitos e obrigações.” (1)

O segundo texto é do Cardeal Levada:

“Graças às Constituições dos Estados Unidos, viemos à vida num país que nos garante o direito natural à liberdade religiosa. Todos temos o direito de professar nossa fé de acordo com a nossa consciência. A proibição de que o governo professe uma religião particular lhe impediu de adotar uma atitude ‘desinteressada’ frente a todas as religiões (…) A Igreja, com efeito, reconhece e comparte com entusiasmo a proibição constitucional de reconhecer uma religião do Estado ou de impedir o seu livre exercício”. (2)

Não lhes parece que este último texto está em total ruptura com o ensinamento tradicional da Igreja? Provém de quem hoje é Cardeal da Santa Igreja e foi elevado ao cargo de Prefeito da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé! O Papa Bento XVI, ao voltar faz algumas semanas de uma viagem pelos EUA, retomou quase literalmente estas considerações. Estes são os princípios que condenaram à morte a Cristandade e fizeram vã qualquer tentativa de restauração católica desde faz muitíssimos anos.
A Igreja precisa contar com bispos integralmente católicos que ensinem o mesmo que Gregório XVI, de Pio IX, de Leão XIII, de São Pio X, ou de Pio XII, que a iluminaram com os seus ensinamentos. Estes Papas souberam professar a verdade e denunciar o erro. A Igreja e a sociedade civil precisam de doutores da fé que sejam ardentes, que estejam convencidos de que a Tradição católica não é algo caduco. Dói-nos comprovar que não há nenhum bispo em exercício que tenha lucidez sobre as origens da crise que sofremos. Nenhum aceita ter um juízo crítico sobre os textos do último concílio – ecumenismo, liberdade religiosa, colegialidade – que estão em ruptura com a Tradição. Nenhum quer regressar oficial e habitualmente à Missa tradicional e aos sacramentos que santificaram gerações e gerações de católicos.
Pedimos aos bispos que nos falem do “Deus que se fez homem” e sobre a sua doutrina salvífica, e não do “homem que se fez deus” como acontece com tanta freqüência. Pedimos com urgência que iluminem as nossas inteligências e fortaleçam a nossa vontade, ajudando-nos a amar a Deus e segui-Lo. Basta já de exaltar a consciência humana livre de toda atadura superior!
E foi unicamente porque nenhum bispo se conformava a este papel sublime, que faz 20 anos Dom Marcel Lefebvre sagrou quatro bispos, desejando suprir assim a estas trágicas deficiências. Não queria deixar-nos órfãos depois de sua morte. E essa foi a que assim se chamou “Operação Sobrevivência” (3), a qual resgatou o sacerdócio e a Tradição católica. Onde estaríamos hoje em dia se este ato providencial não houvesse tido lugar? Nosso fundador, no dia 30 de julho de 1988, realizou um ato heróico de caridade consagrando quatro bispos e sacrificando assim sua reputação pelo bem das almas e da Igreja.
Faz já 20 anos que vemos, certamente, alguns avanços positivos como o Motu proprio; mas nos fatos, a situação continua sem mudanças e o erro se fez mais sutil do que nunca… Em julho passado, por ocasião das ordenações sacerdotais administradas aos seminaristas da Fraternidade São Pedro, o Cardeal Castrillón Hoyos exortou no seu sermão aos sacerdotes a concelebrar com seu bispo “ao menos na Missa crismal e quantas vezes isso seja conveniente para manifestar a plena comunhão eclesial”. Nessa mesma linha, faz algumas semanas a Fraternidade São Pedro recebeu uma paróquia pessoal em Roma, mas teve que aceitar em troca que um sacerdote diocesano celebrasse todos os domingos uma Missa nova. Vinte anos atrás o Cardeal Ratzinger exigia como condição a Dom Lefebvre que todos os domingos se celebrasse a Missa de Paulo VI em Saint-Nicolas-du Chardonnet em Paris. Não… a situação não mudou essencialmente depois dessas duas décadas… O Vaticano II continua intocável. Como pode pretender-se que tenhamos confiança diante de fatos que falam por si só? A Fraternidade São Pio X, juntamente com outras congregações tradicionais, é a única que grita as verdades a toda voz e denuncia os erros. Todos os que assinaram um acordo com Roma tiveram que se calar e são inoperantes em ordem à restauração da Tradição. Essa, e não outra, é a triste realidade!
Queridos fiéis, o estado de necessidade continua existindo hoje ainda maior; e mais do que nunca temos a necessidade de contar com os quatro bispos auxiliares da Fraternidade São Pio X para fortalecer-nos na Fé e santificar-nos. Que Deus os fortaleça. Demos-lhes nossos sinceros agradecimentos pela sua constante entrega por nossas almas. Retribuamos-lhes com nossas orações.
Rezemos e façamos penitência pela Igreja e pelo Papa. Supliquemos a Deus que converta os bispos do mundo inteiro para que recuperem e façam valer suas vozes. Disso depende a salvação de milhões de almas e o êxito de toda a restauração católica.
Que Deus os abençoe!»

(1) “Vehementer nos”, 11 de fevereiro de 1906.
(2) Cardeal William Levada: Reflexões sobre o papel dos católicos na vida política e recepção da sagrada comunhão, 13 de julho de 2004.
(3) Dom Marcel Lefebvre, sermão das sagrações episcopais, 30 de julho de 1988.

Christian Bouchacourt, Pbro. (Superior del Distrito de América del Sur, Hermandad de San Pío X)

(RCS)

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