por João César das Neves
A Igreja é hoje desprezada, insultada, perseguida. Isso é normal e comum. Foi sempre assim ao longo dos séculos, de uma forma ou de outra. Os evangelhos avisam-no, os salmos, profetas, epístolas e a História descrevem-no. Existe, porém, um elemento estranho e inesperado desta vez o ataque é contra a posição cristã sobre a família, vida e sexo.
Nos últimos dois milénios o mundo, que tantas vezes condenou a fé, instituição, política, missionação ou doutrina social da Igreja, concordou em geral com a sua moral sexual. Não era seguida e muita gente fazia o contrário, mas todos, mesmo os que a violavam, sabiam que a visão cristã da sexualidade era equilibrada, sábia, louvável. Hoje pela primeira vez, a sociedade, que aceita muito do que Cristo pregou sobre justiça, direitos e misericórdia, despreza este ponto da doutrina.É comum ouvir dizer que a Igreja tem nos temas do sexo uma posição doentia e extremista. Mas o ataque vem na época que, precisamente nesta área, apresenta a atitude mais desequilibrada e anormal de sempre. Vivemos o primeiro tempo que quis desmantelar costumes milenares e alegadamente não tolera aqui quaisquer regras ou proibições. Uma sociedade tão justamente rígida no dinheiro, violência, racismo, recusa a menor limitação no prazer. Os resultados estão à vista desordem emocional e social, queda da população, proliferação da solidão, depressão, divórcio, deboche, multiplicação de abusos e perversões. Dificilmente se podem pedir provas mais evidentes do falhanço.
Para esconder a evidência surge uma absoluta ditadura dogmática. Vê-se um esforço enorme para "ao mal chamar bem, e ao bem, mal" (Is 5, 20). Quem se atrever a defender em público o casamento, fidelidade, castidade, família e natalidade é considerado cómico e aberrante. Pior ainda, quem se arriscar a discordar (obviamente com diferente gravidade) do aborto, eutanásia, promiscuidade, pornografia e homossexualidade é réprobo e maldito. Sobre a homossexualidade (a favor) e a virgindade (contra) só existe uma posição possível, e quem a contrarie é ridicularizado, insultado, levado a tribunal.O Padre Lereno Dias, um respeitadíssimo sacerdote do Patriarcado, foi recentemente enxovalhado nos jornais e atacado por um líder político apenas por ler trechos de documentos da Santa Sé no sermão de uma Missa transmitida pela rádio.
Será que a sociedade mudou assim tanto? Hoje as juras de amor já não são para sempre? O divórcio deixou de ser fracasso? O aborto não mata? A homossexualidade é mesmo recomendável? A promiscuidade, pornografia, prostituição afinal não criam problemas?
Esta opressão intelectual é tão avassaladora que muitos, dizendo-se cristãos, esquecem a sua fé neste campo. Mas a escritura, catecismo e documentos pontifícios não podem ser mais claros. A Igreja, aqui como sempre, tem as posições mais elaboradas e fundamentadas de todas. Só que, como a História manifesta, a cegueira ideológica é paralisante quando a opinião pública a impõe.
A acusação à Igreja não é só de extremismo, mas também de fanatismo. Como os acusadores não sabem discordar de uma opinião sem atacar quem a defende, projectam a sua atitude e censuram por intolerância e obsessão aqueles que apenas formulam a posição cristã. Voltam as alusões às clássicas cruzadas e Inquisição e apregoa-se o perigo de prisões e fogueiras que só existe em imaginações incendiárias. Os cristãos receberam ordens de combater os erros mas amar sempre os inimigos.
Não somos anjos e todos vivemos num corpo. Mas isso não implica a apoteose da alarvice hoje apregoada por mil formas. Por aqui passa o combate civilizacional do nosso tempo.
Uma cultura que aceitou os direitos humanos, liberdade e solidariedade está a comprometer tudo com a sua paixão pelo prazer.
Os horrores do aborto e pedofilia mostram bem essa possibilidade.
Os dramas sociais e a decadência populacional europeia hão-de acabar por impor a sensatez da milenar Igreja de Cristo.
Até lá espera-nos, como sempre, a perseguição.
(Diário de Notícias, 14 de Março de 2005)
RCS
terça-feira, maio 03, 2005
Perseguição à vista
Publicada por
Rafael Castela Santos
à(s)
terça-feira, maio 03, 2005
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