Equilibra-se o pêndulo da questão, e refuta-se a existência de uma suposta dicotomia entre o comportamento do Vaticano e o de muitos cristãos. Sobre o assunto, passo a transcrever o comentário que fiz a um dos postais que me tinha como destinatário, todos eles publicados pelo Jansenista:
Caro Jansenista, não vou polemizar porque:
a) por um lado, no essencial, estou de acordo consigo quando sustenta que Pio XII não era um nazi, nem um perseguidor de judeus; que o livro de John Cornwell constitui uma visão extrema; e que a peça de teatro de Rolf Hochhut - "O Vigário" - é historicamente infundamentada (li-a numa edição do "Livre de Poche", há mais de vinte anos, numa férias de Verão, tinha então dezoito anos);
b) por outro lado, a minha falta de tempo, bem como o meu cansaço são tremendos, e não se compadecem correntemente com discussões elaborados e prolongadas.
Sem prejuízo, sempre acrescentarei:
1º) A acção de Pio XII durante a II Guerra Mundial tem de ser sempre encarada à luz daquilo que o Papa conhecia ao tempo dos acontecimentos, e não do que nós sabemos hoje: que outro dirigente desse período, e durante o desenrolar do conflito, se insurgiu publicamente contra as perseguições aos judeus e as denunciou como política de genocídio? Ou, por que motivo os aliados jamais tentaram destruir com bombardeamentos o sistema ferroviário alemão, ferramenta imprescindível na deportação da população judaica para os campos de concentração? Certamente, porque a verdade em toda a sua extensão só foi conhecida no final da guerra, em 1945, com a chegada das tropas aliadas a Belsen ou Dachau.;
2º) Recordo que tão cedo quanto 1937, a Igreja Católica, por intermédio da encíclica "Mit Brennender Sorge", assinada pelo Papa Pio XI, mas inteiramente inspirada e redigida pelo seu Secretário de Estado Eugénio Pacelli - o futuro Pio XII -, condenou vigorosamente as políticas totalitárias e pagãs do regime nacional-socialista. Outrossim, durante a guerra, se as deportações de judeus em Itália - e em Roma, especialmente - foram mínimas por contraposição ao que sucedeu noutros sítios, tal deveu-se à decisiva intervenção do Papa, tanto a nível diplomático como de acção concreta, nomeadamente através da transformação do Vaticano e de Castelgandolfo em verdadeiros centros de acolhimento e trânsito de refugiados guerra; à constante crítica da Rádio Vaticano à Alemanha nacional-socialista, circunstância que acarretou sucessivos protestos diplomáticos alemães, que viam em tal emissora um órgão de propaganda aliado; enfim, ao "silêncio" papal que foi levado tão longe quanto o de impor o escudo pontifício sobre o edifício Grande Sinagoga de Roma, concedendo-lhe o estatuto de território da Santa Sé, e colocando-o assim salvo da ingerência alemã. Enfim, relembro todos os judeus, num número que se elevou a centenas de milhares em toda a Europa sob ocupação germânica - cerca de 800.000, calcula-se -, que foram escondidos em mosteiros, conventos, residências paroquiais, e residências particulares de famílias católicas, ou que gozaram da emissão de certificados de baptismo falsos, numa política totalmente inspirada pelo Papa Pio XII, que os livrou do terrível destino da deportação. Por fim, mas não menos importante, como não relacionar também com o comportamento de Pio XII durante os anos da guerra, a conversão ao Catolicismo do Rabino de Roma, no final da guerra, que se fez baptizar com o nome de… Eugénio Zolli?... Sobre toda esta temática, para não me alongar demais, sugiro a leitura do artigo que o meu estimado companheiro de blogue, Rafael Castela Santos, escreveu em Maio de 2005, intitulado "Seguro que la Iglésia Católica no critico al nazismo?
3º) O Papa João Paulo II, no Yad Vashem, deplorou profundamente a fatídica sorte que boa parte dos judeus europeus sofreram durante a II Guerra Mundial, mas se bem me lembro, apesar das intensas pressões que sofreu nesse sentido, em momento algum apresentou desculpas pelo susposto silêncio do Papa Pio XII face às perseguições movidas contra os mesmos judeus;
4º) Finalmente, um desabafo da minha parte: não posso deixar de lamentar que aqueles que mais estridentemente acusam o silêncio de Pio XII - e aqui não falo obviamente do caríssimo Jansenista - são os mesmos que jamais se dignaram pestanejar sequer enquanto milhões de católicos eram acossados, perseguidos e massacrados na Rússia, no México, em Espanha, e, ulteriormente, nos países da "Cortina de Ferro", na China, Coreia do Norte e Vietname…
JSarto
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