Li ontem à noite o discurso que Sua Santidade o Papa Bento XVI proferiu no passado dia 12 de Setembro, na Universidade de Regensburg, e que desde então tanta polémica tem causado à escala mundial. Em minha opinião, trata-se de uma intervenção notável e abundante de ensinamentos, ainda que não pelo motivo de todos conhecido, ou seja, o de um suposto ataque papal ao Islão, que de facto não ocorre, e apenas pode ser vislumbrado por mentes mal intencionadas e/ou analfabetas. Ao invés, tal entendimento obnubila o significado mais profundo da alocução pontifícia, o qual não foi apreendido pela generalidade de uma comunicação social pouco sensível a temáticas de natureza religiosa: na verdade, em Regensburg, Bento XVI aparta-se decisivamente daquilo a que Dietrich von Hildebrand chamava a ecumenite, isto é, o mau ecumenismo, fruto directo do espírito antitradicional que o Concílio Vaticano II gerou no seio da Igreja, promotor de um relativismo e sincretismo de inspiração maçónica para o qual todas as religiões se equiparam entre si e são igualmente válidas para a salvação dos homens, numa concepção completamente contrária a todo o espírito verdadeiramente católico.
Profundamente escorado no pensamento teológico tradicional, o Papa traça com mestria o que distingue determinantemente a doutrina católica da doutrina islâmica sobre a natureza de Deus, recapitulando um ensinamento de pura matriz tomista. Assim, por força da palavra papal, cai por terra a falácia comummente repetida pelos ecumenistas radicais de que católicos e muçulmanos adoram um mesmo Deus. Não adoram, não só porque muçulmanos negam a existência da Santíssima Trindade e, consequentemente, a Divindade de Cristo, mas também porque têm distintas concepções dos atributos de Deus, como Bento XVI tão bem sublinha!
O restante conteúdo do discurso de Regensburg, embora menos notado, tem igualmente uma enorme importância, já que o Papa de modo sucessivo:
a) em defesa da tradição católica, critica o princípio da "sola scriptura", postulado basilar da chamada reforma protestante, algo totalmente inconcebível para o "espírito do V2";
b) na melhor linha da encíclica de São Pio X, "Pascendi Domenici Gregis", censura o pensamento teológico liberal dos séculos XIX e XX, caldo onde medraram as heresias modernista e progressista, de que o mesmo Papa se assume agora como firme opositor, por obra do Espírito Santo e uma vez mais em radical contradição com o "espírito do V2";
c) finalmente, condena a mentalidade niilista das sociedades descristianizadas do Ocidente contemporâneo, bem como a superstição racionalista-cientifista por estas idolatrada, e que nada tem a ver com o uso da razão natural tal como o Cristianismo sempre a entendeu, circunstância que o Santo Padre uma vez mais explicita perfeitamente.
Em resumo, o notável discurso de Regensburg assinala a entrada do pontificado de Bento XVI em velocidade de cruzeiro e no bom caminho da tradição, dando a perceber que o nosso Papa está verdadeiramente empenhado numa efectiva restauração da Igreja Católica.
JSarto
0 comentários:
Enviar um comentário